Mosquito da dengue criou resistência a repelente, diz pesquisa
Uma pesquisa
conduzida por cientistas na Grã-Bretanha revelou que o mosquito da
dengue aparentemente desenvolveu resistência a um princípio ativo
presente na maioria dos repelentes atualmente comercializados no mundo,
inclusive no Brasil.
A substância, conhecida como DEET, ou
dietiltoluamida, é largamente empregada em repelente contra insetos,
combatendo mosquitos, pernilongos, muriçocas e borrachudos. O composto
age interferindo nos receptores sensoriais desses animais, inibindo seu
desejo de picar o usuário.
O estudo, divulgado pela publicação
científica Plos One, analisou a reação de mosquitos da espécie Aedes
aegypti, vetores da dengue e da febre amarela, à substância. Os
cientistas concluíram que, ainda que inicialmente repelidos pelo
composto químico, os insetos depois o ignoraram.
Eles recomendaram que governos e laboratórios farmacêuticos realizem mais pesquisas para encontrar alternativas à DEET.
Segundo
a Organização Mundial da Saúde (OMS), a dengue é hoje a doença tropical
que se propaga mais rapidamente no mundo. Nos últimos 50 anos, sua
incidência aumentou 30 vezes, o que pode transformá-la em uma pandemia,
advertiu o órgão.
Isca
Para provar a eficácia da DEET os
cientistas pediram a voluntários que aplicassem repelente com DEET em um
braço e soltaram mosquitos.
Como esperado, o repelente afastou
os insetos. No entanto, poucas horas depois, quando ofereceram aos
mesmos mosquitos uma nova oportunidade de picarem a pele, os cientistas
constataram que a substância se mostrou menos eficiente.
Para investigar os motivos da ineficácia da DEET, os pesquisadores puseram eletrodos na antena dos insetos.
"Nós
conseguimos registrar a resposta dos receptores na antena dos mosquitos
à DEET, e então descobrimos que os mosquitos não eram afetados pela
substância", disse James Logan, da London School of Hygiene and Tropical
Medicine, instituição que realizou o estudo.
"Há algo sobre ter
sido exposto ao composto químico pela primeira vez que muda o sistema
olfativo dos mosquitos. Ou seja, a substância parece mudar a capacidade
dos mosquitos de senti-la, o que a torna menos eficiente", acrescentou.
Uma
pesquisa anterior feita pela mesma equipe descobriu que as mudanças
genéticas em uma mesma espécie de mosquito podem torná-los imunes à
DEET.
"Os mosquitos evoluem muito rapidamente", disse ele.
"Quanto mais nós pudermos entender sobre como os repelentes funcionam e
os mosquitos os detectam, melhor poderemos trabalhar para encontramos
soluções para o problema quando tais insetos se tornarem resistentes à
substância".
O especialista acrescentou que as descobertas não
devem impedir as pessoas de continuarem usando repelentes com DEET em
áreas de alto risco, mas salientou que caberá aos cientistas tentar
desenvolver novas versões mais efetivas da substância.
Para
complementar o estudo, os pesquisadores britânicos agora planejam
entender por quanto tempo o efeito dura depois da primeira exposição ao
composto químico.
A equipe também deve estudar o efeito em outros mosquitos, incluindo espécies que transmitem malária.
Brasil
No
Brasil, a dietiltoluamida está presente na maioria dos repelentes
encontrados à venda. Produtos com termetrina e citronela também podem
ser achados, mas em menor número.
Não é a primeira vez, entretanto, que a substância causa polêmica.
No
ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) abriu à
consulta popular uma proposta de resolução para assegurar a segurança e
a eficácia dos repelentes a ser adotada pelos fabricantes.
No
documento, cujo objetivo era disciplinar o comércio desse tipo de
produto, o órgão determinava, por exemplo, a proibição do uso de
repelentes com DEET em crianças menores de dois anos, além de informar
sobre a necessidade de um estudo prévio para produtos com dosagem acima
de 30% para um público acima de 12 anos. Em altas dosagens,
especialmente em crianças, repelentes com DEET podem ser tóxicos.
Em entrevista à
BBC Brasil,
Jorge Huberman, pediatra e neonatologista do Hospital Albert Einstein e
diretor do Instituto Saúde Plena, sugeriu alternativas ao uso de
repelentes com DEET.
"É comum que depois de algum tempo os
mosquitos adquiram certa imunidade ao produto, ainda que sejam
necessários mais estudos para comprovar tal tese", explicou.
"Como
alternativa, as pessoas podem usar repelentes com citronela e tomar
complexo B, cujo cheiro desagrada os mosquitos, além, é claro, de usar
mosquiteiros", disse.